terça-feira, 3 de maio de 2011

A VIAGEM DE UM XAMÃ - Xama Aprendiz

 

 

Reconto uma velha história dos xamãs escandinavos...
Thorvald, um misterioso xamã, resolveu viajar até os céus onde moravam os deuses e divindades de todo o Universo.
Certa noite, ele fez suas poderosas meditações e preces, subindo como uma águia até as distantes mansões celestiais.
Primeiro ele encontrou um grande palácio, todo fortificado e protegido pelos anjos mais terríveis e fulgurantes. Adentrando por uma fortificada porta de ouro, caminhou até a sala principal onde encontrou um deus idoso e luminoso, sentado em um magnífico trono de fogo.
Irado com aquela invasão, o deus perguntou ao xamã o que fazia ali e o ameaçou com terríveis maldições.
Thorvald respondeu que desejava conhecer a verdadeira natureza dos deuses e tirar suas próprias conclusões.
O deus então gritou, lamentou, lembrando ao mortal xamã que ali não era lugar de simples humanos. Depois pediu que fosse rapidamente embora, voltando à terra para cumprir os deveres impostos aos seus pobres habitantes.
Thorvald, sem perder a compostura, perguntou se havia alguma vantagem em seguir os ensinamentos e os mandamentos de um deus tão bravo e exigente.  Irritado ainda mais, o deus o expulsou dali.
Tranquilamente Thorvald acenou e foi embora um tanto desapontado.
Em seguida, voando mais alto, ele avistou outro palácio celestial.  Era uma construção muito bela, florida e perfumada. Ali morava o deus do amor.
Mais uma vez, Thorvald entrou sem ser anunciado, encontrando um deus afável e carinhoso, sentado em uma simples almofada.
O deus do amor, dando mostras de satisfação, gentilmente perguntou ao xamã quem era ele e o que desejava ali em sua modesta morada.
Thorvald respondeu que desejava conhecer a verdadeira natureza dos deuses e tirar suas próprias conclusões.
O tranqüilo deus ficou profundamente triste com tal pergunta. Argumentou que necessitava ser amado, acarinhado, respeitado, pois sofria por todos os humanos e tinha dado tudo para a ignorante humanidade, sem nada receber em troca. Depois disso, desabou em lamentos infindáveis.
Thorvald, sem ficar abalado, perguntou se havia alguma vantagem em seguir os ensinamentos e os mandamentos de um deus tão bom, carente e pedinte.
O deus do amor abaixou os olhos e suspirou longamente...
Thorvald, decepcionado mais uma vez, saiu daquele lugar. Na imensidão dos céus, desta vez resolveu voar mais longe e mais alto ainda.
Viajando além das estrelas jamais vistas a olho nu, viu ao longe uma magnífica fortaleza e dentro dela uma pequena cidade.
Entrou nela, andou pelas ruas e ouviu uma grande algazarra vinda de uma espécie de taverna.
Assombrado por tão grande alarido, Thorvald abriu a porta e encontrou uma centena de deuses gritando, cantando e rindo como crianças.
Subindo em cima de uma mesa, ele valentemente indagou que espécie de espelunca celeste era aquela e que tipo de deuses malucos eram eles.
Ninguém respondeu... Thorvald passou a gritar cada vez mais forte, mas nada acontecia.  Ele era completamente ignorado pelos divertidos convivas.
De repente, um jovem e belo deus olhou para ele e o convidou para um trago.
Thorvald, que já havia visto de tudo sob o céu e debaixo da terra também, ficou completamente atordoado com tal comportamento e sugestão. Não suportando mais aquela ridícula cena, ele começou ofender todos os que ali estavam sem temer as consequências.
Os deuses pararam a brincadeira, olharam para Thorvald e caíram em uma debochada gargalhada. Em seguida retomaram  suas canções e jogos.
O jovem e belo deus tornou a olhar para o confuso xamã e disse alegremente:
- Meu filho, você nada entende de boas maneiras. Sabe que podemos destruí-lo agora mesmo?  Mas de que adiantaria?  Já que viajou tanto para buscar uma verdade, sente-se e beba conosco!  Contudo, escreva em seu coração: sempre desconfie de um deus e de uma religião que não tenha senso de humor!
O xamã, caindo em si, agradeceu a lição e foi embora pensativo.
Retornando rapidamente para junto dos humanos, Thorvald estava completamente satisfeito. Aprendera a verdadeira natureza dos deuses e divindades. Encontrara, por fim, o sentido real da religião.
Centenas de anos se passaram e a pobre humanidade voltou a ser séria, iracunda, fanática, chorosa e egoísta em matéria de religião. Deuses sedentos de vingança ou repletos de culpa fazem sucesso na vida moderna.  O xamã Thorvald, hoje habitando o céu dos alegres deuses e deusas, olha para baixo e ri de todos nós!

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